Dia Internacional de Conscientização e Prevenção da LER/DORT

Divido com os Amigos Leitores, um texto informativo que preparei para meu setor. Apesar da data já ter passado, o tema é atemporal, portanto sempre bem vindo.

                                                                      Daniela

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DIA INTERNACIONAL  DE CONSCIENTIZAÇÃO DA LER/DOR


Dia 28 de fevereiro, bem como a semana que a compreende, é um dia importante na promoção em Saúde do Trabalhador que é o Dia Internacional de Prevenção às LER/DORT, abreviação de Lesões por Esforços Repetitivos/Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho. No Estado de São Paulo, a partir da Lei 12.103 de 11 de outubro de 2005, foi instituído o “Dia da Prevenção às LER/DORT”, passando a fazer parte do Calendário Oficial de Eventos do Estado.

Mas porque um dia especial para tratar deste assunto?

Os distúrbios osteomusculares compõem uma das principais preocupações na área de prevenção em saúde no trabalho devido sua alta prevalência em várias categorias profissionais, podendo acometer vários segmentos corporais, sobretudo membros superiores. (mãos e braços). Quando não prevenido ou tratado precocemente torna-se um problema crônico e altamente incapacitante, não apenas para o trabalho, mas para a grande maioria das atividades pessoais de autocuidados, domésticos e lazer, comprometendo por conseqüência toda a vida pessoal , afetiva e social do trabalhador. Compromete também em alguns casos o potencial de empregabilidade nas funções em que obrigatoriamente é imprescindível o uso das mãos e braços, como por exemplo, digitadores, dentistas, operários, cabeleireiros, músicos, costureiras, dentre outros, interrompendo precocemente carreiras promissoras. E por fim pode favorecer a ocorrência de transtornos mentais como a depressão, pelo conjunto de dificuldades de desempenho, acrescido da convivência diária com dores, exigindo tratamento psiquiátrico e psicológico.

As doenças ocupacionais não são fenômenos novos, pois desde o século XVI já se encontram relatos de estudos de acidentes de trabalho e adoecimento com mineradores ( ano de 1.556 com George Bauer ou Georgius Agrícola, Pai da Mineralogia). Mas é no século XVIII com Bernardo Ramazzini médico italiano, considerado Pai da Medicina do Trabalho, ao observar em torno de 50 profissões diferentes, inovou trazendo uma visão integrada em saúde no trabalho, elaborando nexos causais entre ofício e distúrbios observados e introduzindo a visão abrangente em saúde abarcando promoção, prevenção e tratamento. Desde então a história traz outros estudos como Fritz De Quervain (1891) que descreve a tenossinovite de lavadeiras e no século XX com o implemento da industrialização crescem estudos com datilógrafos, telefonistas e operários de linha de montagem.

Em tempos recentes a partir dos anos 1980 este problema passa a ganhar destaque na literatura especializada, surgindo uma série de documentos e manuais para esclarecimento e prevenção por parte da Organização Mundial da Saúde e Organização Internacional do Trabalho, considerando não apenas a relação direta homem e tarefa, mas tentando compreender a partir dos estudos da ergonomia os demais elementos de entorno que contribuem para sua ocorrência. No Brasil, As LER/Dort, foram primeiramente descritas como tenossinovite ocupacional. Foram apresentados, no XII Congresso Nacional de Prevenção de Acidentes do Trabalho - 1973, casos de tenossinovite ocupacional em lavadeiras, limpadoras e engomadeiras, recomendando-se que fossem observadas pausas de trabalho daqueles que operavam intensamente com as mãos

Na história recente na área de políticas públicas brasileiras destacamos os movimentos populares de trabalhadores, ganhando intensidade no início dos anos 1980, com o aumento da incidência de tenossinovite entre profissionais da área de processamento de dados e a luta pelo seu reconhecimento como doença ocupacional. Através destas mobilizações foi trazida à tona a complexidade do tema, impulsionando tanto o aumento de pesquisa como a criação de normatizações para fins de prevenção. Estudiosos da área apontam como um importante marco para o reconhecimento das lesões por esforços repetitivos como doença ocupacional o V Congresso Nacional de Profissionais de Processamento de Dados em 1984 e o I Encontro Estadual de Saúde dos Profissionais do Rio Grande do Sul (1986) onde houve a modificação da terminologia LER para DORT. A partir de toda esta construção já se tem disponível um vasto repertório de conhecimento que permitem estabelecer seu nexo causal e políticas preventivas, contribuindo para a inclusão da Saúde do Trabalhador como um dos eixos de atenção do SUS, a partir da Constituição de 1988.

Estatísticas no Brasil

De acordo com 19ª. Edição do Anuário Estatístico da Previdência Social de 2010 , no Brasil foram registrados 701.496 casos de acidentes de trabalho, nos quais se incluem as doenças ocupacionais por também serem consideradas acidentes de trabalho. Deste total 378.564 casos são da região sudeste sendo o estado de São Paulo responsável por mais da metade dos casos com 242.271 (MG - 74.763; RJ - 47.938; ES – 13.592)

Considerando diagnóstico a partir da Classificação Internacional de Doenças (CID 10) dentre os 50 códigos mais incidentes dentre os casos de acidente/adoecimento ocupacional os quadros relacionados às LER/DORTs ocupam as seguintes posições: no total de 733.365 registros, na classificação geral aparecem em 2º. lugar as dorsalgias com 47.554 registros; em 7º. lugar as lesões do ombro com 21.737 registros; e em 9º. lugar a Sinovite e tenossinovite com 19.082 registros.

Dentre as ocupações registradas destacamos aquelas onde a probabilidade de incidência da LER/DORT é maior: escriturários com 40.907 caso; trabalhadores nas indústrias têxtil, do curtimento, do vestuário e das artes gráficas com 14.878; trabalhadores em serviços de reparação e manutenção mecânica 16.194.

Mas do ponto de vista prático como prevenir?

Principais sintomas que podem indicar a LER/DORT. De acordo com o Protocolo do Ministério da Saúde sobre Dor Relacionada com o Trabalho (2012) as queixas mais comuns são dor localizada, irradiada ou generalizada, desconforto, fadiga e sensação de peso, formigamento, dormência, sensação de diminuição de força e fadiga, edema e enrije¬cimento muscular, choque e falta de firmeza nas mãos, sudorese excessiva nas mãos e sensação de dor diante de estímulos a princípio não nocivos à pele. É importante notar que os sintomas são de evolução insidiosa, geralmente sendo percebidos em estágio avançado, quando aparecem as dores e dificuldades de movimentação tanto no trabalho como nas atividades cotidianas. Os sintomas costumam ser desencadeado quando há períodos de maior quantidade de trabalho ou jorna¬das prolongadas.

A prevenção devem obrigatoriamente abranger ações conjuntas entre trabalhador e empregador.

Para o empregador:

• Dar atenção as mínimas queixas de desconforto apresentada pelos trabalhadores, não subestimando-as.

• Observar no coletivo de trabalhadores a ocorrência de queixas e se há predominância em algum setor ou tarefa específicos.

• Realizar um adequado planejamento ergonômico do ambiente de trabalho, de forma a adaptá-lo as necessidades físicas e mentais do trabalhador (adequação de equipamentos diversos, mobiliário, iluminação, temperatura, carga cognitiva de trabalho, entre outros)

• No planejamento de produção, incluir pausas durante a jornada, evitar sobrecarga de trabalho, adequar ritmo de produção, permitir rodízio de tarefas.

• Promover clima saudável de trabalho, sobretudo na relação entre chefia e funcionários, prevenindo pressões psicológicas.

• Investir em programas de Qualidade de Vida no Trabalho e de Educação em Saúde, de médio e longo prazos, que sejam acompanhados periodicamente e com avaliação de resultados.

Para o trabalhador:

• Procurar ajuda já nos primeiros sintomas (tanto físicos como mentais) informando o setor responsável da empresa em que trabalha;

• Respeitar as pausas para descanso ou reinvindicá-las caso não existam

• Com orientação de profissionais de saúde realizar exercícios preventivos durante a jornada de trabalho

• Com orientação de profissionais de saúde manter postura adequada na execução das tarefas.

• Participar ativamente de todas as ações preventivas organizadas pela empresa ou reinvindicá-las caso não existam.



Referências
 
Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador. Dor relacionada ao trabalho : lesões por esforços repetitivos (LER) : distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (Dort) / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador. – Brasília : Editora do Ministério da Saúde, 2012. 68 p. : il. – (Série A. Normas e Manuais Técnicos) (Saúde do Trabalhador ; 10. Protocolos de Complexidade Diferenciada)

Diário Oficial Poder Executivo - Seção I quarta-feira, 12 de outubro de 2005 , São Paulo, 115 (194)– 3


Integralidade e doenças dos trabalhadores - O método de Bernardino Ramazzini. Luiz Carlos Fadel de Vasconcellos, Rosangela Gaze.Texto definitivo elaborado na Oficina de Artigos da Pós-Graduação em Saúde Pública / Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca / Fundação Oswaldo Cruz. Itaipava / RJ, 01 a 05/06/2009.

Grandes Vocações: Vocação e política - Luiza Erundina

Gosto muito de biografias e hoje trago mais uma bela história de vida.
Sem entrar no mérito partidário, apreciem esta bela entrevista que a Deputada Federal Luíza Erundina concedeu à Revista Rogate de Animação Vocacional (Congregação dos Rogacionistas do Coração de Jesus).
Que esta entrevista estimule os Amigos Leitores e refletirem sobre sua vida profissional pela ótica da missão de vida, qual a sua contribuição para a humanidade.

Apreciem!

                                                                               Daniela

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REVISTA ROGATE DE ANIMAÇÃO VOCACIONAL/ jan 2012



Vocação e política

Aos 77 anos, a deputada federal Luiza Erundina fala de sua vocação à vida pública,
da necessidade de posturas éticas e da importância dos valores cristãos na sua vida




Paraibana, Luiza Erundina de Sousa é a sétima filha de Antonio Evangelista de Souza e Enedina de Souza Carvalho. Nasceu em 30 de novembro de 1934 em Uiraúna (PB). Passou a adolescência ajudando a família. Luiza Erundina repetiu a 5ª série duas vezes só para não parar de estudar, já que na escola aonde aprendeu as primeiras lições não havia curso ginasial (hoje ensino fundamental). Aos 10 anos foi morar em Patos (PB) na casa de uma tia, para cursar os Ensinos Fundamental e Médio.

Formada em Serviço Social, pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), a leiga cristã, mestre em Ciências Sociais, parlamentar e professora universitária, assumiu seu primeiro cargo público aos 24 anos, como Secretária de Educação e Cultura de Campina Grande (PB), em 1958. Nos anos de 1968/1969 fez mestrado em Ciências Sociais pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo.
Em 1971 mudou-se definitivamente para São Paulo (SP), fugindo da perseguição política oriunda da ditadura militar. Luiza Erundina militava na Pastoral da Terra da Arquidiocese da Paraíba, onde trabalhou com o arcebispo Dom José Maria Pires. Na capital paulista, prestou concurso público para assistente social da Prefeitura e passou a trabalhar junto aos movimentos populares. Ao mesmo tempo, lecionou em várias faculdades. Fundadora do Partido dos Trabalhadores (PT) em 1980, foi eleita vereadora da capital em 1982; deputada estadual em 1986; prefeita de São Paulo em 1988 e Ministra da Administração Federal no governo do então presidente Itamar Franco, em 1993.

Em 1997 deixou o PT e filiou-se ao Partido Socialista Brasileiro (PSB), legenda pela qual elegeu-se deputada federal em quatro eleições consecutivas: 1998, 2002, 2006 e 2010. Na última eleição, foi eleita com mais de 214 mil votos, sendo a mais votada na capital e a 10ª no estado de São Paulo. 
Atualmente Luiza Erundina é membro titular de duas comissões permanentes da Câmara dos Deputados: Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) e Comissão de Legislação Participativa (CLP). 
A história dessa mulher com a Igreja Católica é longa e fértil. Sua vocação política sempre teve inspiração cristã. A fé de Luiza Erundina tem suas raízes na experiência de Deus, na sua vida de comunidade e na ação pedagógico-educacional. Hoje, aos 77 anos, Luiza Erundina, como deputada, continua dando testemunho de sua fé. Ela concedeu entrevista à Rogate, falando de sua vida, sua fé e sua vocação.
 Rogate: Qual a imagem de Jesus que a senhora carrega desde os tempos da menininha paraibana que cultivou uma espiritualidade encarnada?

Luiza Erundina: Somos de uma família simples e humilde. Meus pais eram católicos praticantes. Desde criança aprendi com eles a viver e a me comportar de acordo com os valores cristãos da honestidade, solidariedade com o outro, apego à verdade, simplicidade e coerência. As figuras de Jesus e Maria eram o foco e inspiração da minha espiritualidade, com forte exigência de encarnar a fé na vida e na história.

Rogate: A palavra vocação significa chamado. A senhora dedicou toda sua vida à atividade pública. Pode-se dizer que essa é sua vocação?

Luiza Erundina: Já na adolescência senti um apelo forte em relação ao sentido coletivo da vida. Tanto é que a dimensão pessoal da minha vida sempre esteve condicionada à opção pela vida pública. Acho que esse apelo e essa vontade irresistível de responder a ele podem, sim, ser considerados um sinal de vocação.  
Rogate: Como alguém que expressa publicamente a fé em Jesus e nos seus ideais, quais as principais inspirações cristãs que lhe orientam na vocação de servir ao próximo?

Luiza Erundina: Sinto uma grande identidade com os mais pobres, com os que são vítimas de injustiça. O amor incondicional ao próximo, particularmente em relação aos que mais sofrem, é a força que me move e me faz perseverar na luta em defesa dos seus interesses. Acho que esses sentimentos são expressões da presença de Deus em minha vida e o sentido maior da minha missão no mundo.  
Rogate: Na Paraíba houve perseguição aos membros da Pastoral da Terra. A jovem Erundina fazia parte desta pastoral. Como ocorreu essa perseguição?

Luiza Erundina: Sim, trabalhei na Pastoral da Terra quando Dom José Maria Pires era arcebispo da Paraíba. Aonde íamos, havia alguém espionando e o cerco foi se fechando até que fui forçada a sair de lá. Viajei magoada, com a sensação de ter deixado a luta para trás. Só que quando cheguei em São Paulo, e fui trabalhar nas favelas e nos cortiços, descobri que a luta também estava lá. Há luta no campo, pela reforma agrária, e na cidade, pela reforma urbana. Portanto, o motivo da luta era o mesmo, ou seja, a questão da propriedade da terra. A luta pela democratização do acesso à terra rural e à terra urbana.

Rogate: Em São Paulo, quando a senhora chegou, em 1971, continuou alimentando a vida de fé e participando da comunidade católica. Quais os principais desafios encontrados?

Luiza Erundina: No início foi muito difícil, como o é para todo nordestino que migra para São Paulo. O preconceito e a discriminação são reais, sobretudo há quarenta anos. Agora é um pouco melhor, depois que uma migrante nordestina ousou ser prefeita da cidade. Naquele tempo, minha vida de fé se alimentou na convivência e no trabalho com as Comunidades Eclesiais de Base (CEB’s), na periferia da cidade, onde a vivência cristã, inspirada na Teologia da Libertação, nos animava e nos integrava como irmãos.

Rogate: De descendência pobre, mulher, nordestina... chegando à Prefeitura da maior cidade brasileira. Nesta sua trajetória a senhora afirmou ter sofrido preconceito. Mas como os superou? Hoje a senhora se considera uma paraibana paulista?

Luiza Erundina: Embora alvo de preconceitos nunca me coloquei na condição de vítima. Procurei transformar o preconceito em mais uma causa pela qual lutar. É uma luta ideológica contra um sentimento, nem sempre consciente, mas profundamente arraigado na cultura da sociedade. E muito presente no comportamento preconceituoso de alguns em relação a outros que, por serem diferentes, são considerados inferiores e são tratados como tal. Considero-me uma paraibana em São Paulo e uma paulista na Paraíba.
Rogate: A senhora atuou na política quando residia na Paraíba. Ao se transferir para São Paulo foi possível perceber grande diferença na prática política destas duas regiões do país?

Luiza Erundina: Minha militância política na Paraíba começou no movimento estudantil e na Ação Católica. Depois, como profissional, junto aos movimentos populares. Lá no meu estado não tive militância partidária. Em São Paulo, retomei minha militância como assistente social junto aos movimentos. Isso me levou à militância no movimento sindical, onde conheci Luiz Inácio Lula da Silva. A partir dai me envolvi na fundação e construção do PT.

Rogate: A senhora é reconhecida nacionalmente entre as referencias éticas na política de nosso país. Como conseguiu lidar com os possíveis tradicionalismos, ou elitismos, que marcaram não só a política paulista, mas, sobretudo, a brasileira?

Luiza Erundina: Foi minha origem de classe trabalhadora que determinou minhas posições e práticas políticas. Procuro ser fiel a esse modo de ser. É isso que me ajuda a não me deixar influenciar e me contaminar com práticas tradicionais e elitistas da política. Graças a Deus, e à minha relação com o povo, acho que tenho conseguido.  
Rogate: Como articular a fé em Jesus Cristo e a adesão ao seu projeto com o compromisso efetivo no âmbito público?

Luiza Erundina: A fé em Jesus e a opção pela política como um meio de servir aos irmãos estão imbricadas. Acho que quanto mais eu conseguir ser fiel à minha fé, tanto mais serei consequente e eficaz na construção do projeto político com o qual estou comprometida.

Rogate: É comum dizerem-se cristãos pessoas flagradas em atos desonestos e que atuam como representantes públicos. Nos dias atuais aumentou o abismo entre aquilo que se prega e aquilo que se faz?

Luiza Erundina: A vida em sociedade exige de todo cidadão e cidadã uma postura ética, como pressuposto básico do comportamento de cada um e nas relações entre eles. Ainda mais para quem se diz cristão e exerce um mandato popular ou cargo público! Neste caso, a exigência é ainda maior pela repercussão dos seus atos e suas consequências para o interesse público. Não se trata, apenas, de cobrar coerência entre discurso e prática. É mais que isso. É uma exigência e um pressuposto de toda mulher e de todo homem públicos.

Rogate: Por causa de exemplos negativos, há lideranças comunitárias que evitam se envolver na política partidária com a conhecida alegação de que “a política corrompe” e de que “pessoas honestas não têm vez nem voz na política”. Qual sua opinião a respeito?

Luiza Erundina: Lamentavelmente o mau comportamento de alguns políticos termina por afastar as pessoas, sobretudo os jovens, da política. Mas é preciso fazer essas pessoas entenderem que a política é uma das atividades mais sagradas e indispensáveis a toda sociedade, e é estando no meio dos que a praticam que podemos transformá-la. Uma coisa é a política; outra são os políticos e, como em toda ação humana, há os que são fiéis e outros que traem o compromisso assumido. É preciso distinguir para não ser injusto.

Rogate: Antes da ditadura militar, mas especialmente no período ditatorial, a Igreja Católica teve uma atuação decisiva na defesa dos direitos humanos e na defesa da vida e da liberdade. Muitos mártires católicos no Brasil surgiram neste período. Como a senhora vê a Igreja hoje e qual a perspectiva para o futuro?

Luiza Erundina: A Igreja Católica da Teologia da Libertação cumpriu um papel determinante na defesa dos direitos humanos e na democratização do país. Hoje, porém, tem uma posição recuada em relação a questões de natureza política de interesse geral da sociedade. Cito como exemplo a luta pela criação da Comissão Nacional da Verdade para investigar os crimes da ditadura militar e punir os responsáveis por eles. Até hoje a Igreja não se manifestou a esse respeito.

Rogate: Em decorrência dos recentes casos envolvendo ministros e repasse de verbas para Organizações Não Governamentais, o Governo Federal tem sido extremamente exigente com as entidades sociais, burocratizando o repasse de recursos e dificultando o trabalho das entidades. Isto tem causado transtornos que podem inviabilizar muitos atendimentos sociais. O que deveria ser feito para solucionar ou minimizar o problema?

Luiza Erundina: É preciso uma regulamentação clara e simplificada e, sobretudo, uma fiscalização permanente e rigorosa.

Rogate: Como estimular a participação dos jovens na vida política do país?

Luiza Erundina: Passa por educação política dos jovens nas escolas, em todos os níveis, nas famílias e comunidades que eles frequentam.

Rogate: Há quem diga que vivemos tempos pós-modernos, onde o consumismo, a busca pelo prazer, o relativismo, a globalização, entre outros aspectos, têm abafado a luta por ideais. Qual o impacto de tudo isso na participação política, em especial dos jovens?

Luiza Erundina: O modo de vida atual, estimulado pela mídia que reforça o individualismo, a competição e a falta de solidariedade, sem dúvidas contribui para o descrédito em relação a sonhos e utopias e, consequentemente, para arrefecer a luta e o compromisso com ideias, o que certamente impacta negativamente na participação política, especialmente dos jovens.

Rogate: É possível afirmar que diante da redemocratização e dos “novos tempos”, a participação político-partidária tem sido substituída por outras bandeiras, como a luta em defesa da ecologia, por exemplo?

Luiza Erundina: Os partidos políticos deixaram de ser referência por terem perdido sua identidade ideológica e política e, por isso, não passam de legendas para disputa de poder. Assim, a luta política passou a ser feita através dos movimentos em torno de questões temáticas, como a ecologia. Contudo, não são excludentes; podem se completar e se reforçar.  
Rogate: O fato de o PT estar à frente do Governo Federal por três mandatos, e muitas lideranças políticas que atuavam no movimento popular estarem inseridas no governo, pode ser uma das explicações para a pouca participação da juventude na política e a desestruturação de alguns movimentos populares?

Luiza Erundina: Isso influenciou, mas não é a única explicação. Os jovens perderam o interesse pela política e deixaram de participar por várias razões, sendo a mais importante, a meu ver, o esvaziamento dos partidos políticos. Quanto à desestruturação de alguns movimentos populares, isso se deve ao fato de as lideranças não terem sido renovadas e as bandeiras de luta terem se esgotado. Além disso, as instituições que mais contribuíam para sua formação política, como as Comunidades Eclesiais de Base, o Partido dos Trabalhadores, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a União Nacional dos Estudantes (UNE), entre outras, deixaram de fazê-lo.

Rogate: Qual sua opinião sobre a situação política, social e econômica do Brasil de hoje em comparação com o passado?

Luiza Erundina: A situação econômica e social do Brasil está melhor. Já a situação política é grave. A representação está em crise. A democracia direta não está sendo exercida, os partidos políticos pouco significam e há um descrédito generalizado nos políticos. E, pior que isso: desacredita-se na política. A corrupção tem sido fator de desprestígio e rejeição da ação política, o que é muito grave para a democracia.

Rogate: Estamos em um ano eleitoral e os cidadãos têm uma grande dificuldade para escolher um candidato que mereça o seu voto. A senhora poderia indicar alguns critérios a serem usados na hora da escolha dos candidatos?

Luiza Erundina: Antes de tudo, é preciso conhecer a história do candidato, saber quais são suas propostas e analisar se correspondem ao cargo que está disputando. É preciso também conhecer as posições e os compromissos do partido pelo qual disputa, embora atualmente isso pouco signifique. Exigir do candidato ou candidata, sobretudo, comportamento ético na vida pessoal e na vida pública.

Rogate: Você nunca deixou de lutar por aquilo que acredita, e sempre foi guiada pela fé e pela esperança. Que mensagem poderia deixar aos animadores e animadoras vocacionais, leitores da revista Rogate.

Luiza Erundina: A fé e a esperança são virtudes cristãs que devemos viver em plenitude, encarnadas na história pessoal e na história construída junto com os irmãos. É isso, a meu ver, que dá sentido à escolha que fazemos e que acreditamos ser o desígnio de Deus sobre nós. A fidelidade a esse desígnio nos faz pessoas mais felizes.














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